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Belas esculturas de ossos de 51.000 anos atrás estão mudando nossa visão dos neandertais

Por Conor Feehly
Publicado na ScienceAlert

Como humanos, gostamos de pensar que temos algumas características únicas no reino animal. A linguagem nos permite comunicar com eficiência uns com os outros. A cultura preserva e acumula conhecimento ao longo das gerações. Tecnologia e ferramentas nos ajudam a resolver problemas. Símbolos e arte revelam pistas sobre nossas experiências complexas.

Um crescente corpo de evidências sugere que as características que tendemos a presumir são exclusivas dos humanos modernos, podem ter estado presentes também em nossos primos hominídeos.

Cientistas anunciaram agora a descoberta de um osso de alce-gigante esculpido e gravado com 51.000 anos, produzido pelos neandertais nas montanhas Harz, no norte da Alemanha. Os entalhes no osso de veado são arranjados de forma precisa e artística em padrões chevron.

Evidências anteriores de traços simbólicos e artísticos em neandertais são escassos, mas as novas descobertas levantam questões interessantes sobre o quão complexo o comportamento dos neandertais pode realmente ter sido.

As descobertas se somam a pesquisas anteriores que já apontavam para as características comportamentais complexas dos neandertais, como sua capacidade de produzir e ouvir os sons da fala de humanos modernos, sua produção de ferramentas e tecnologia e seu luto pelos mortos.

Os arqueólogos Dirk Leder, Thomas Terberger e seus colegas dataram o osso de alce-gigante pelo carbono, revelando seus 51.000 anos de idade. A análise microscópica e a replicação experimental sugerem que o osso foi realmente fervido para amolecer antes que a gravação ocorresse.

Até agora, as evidências artísticas dos Neandertais se resumiam a símbolos minimalistas e estênceis feitos à mão nas paredes das cavernas em três sítios arqueológicos espanhóis – La Pasiega, Maltravieso e Ardales.

Os autores do novo estudo acreditam que a gravação de linhas individuais no desenho chevron, combinada com o fato de que esses alces-gigantes (Megaloceros giganteus) eram raros ao norte dos Alpes naquela época, reforça a ideia de que as gravuras têm significado simbólico e mostram evidências para imaginação conceitual em neandertais.

“Os achados arqueológicos de gravuras de artistas são raros e, em alguns casos, ambíguos. Evidências de decorações artísticas sugeririam a produção ou modificação de objetos por razões simbólicas além da mera funcionalidade, adicionando uma nova dimensão à complexa capacidade cognitiva dos neandertais”, escreve Silvia Bello, do Museu de História Natural de Londres, em um artigo do News & Views publicado na Nature.

“A escolha do material, sua preparação antes do entalhe e a técnica habilidosa usada para a gravação são todos indicativos de expertise sofisticada e grande habilidade no trabalho com ossos”, acrescentou Bello.

Uma questão no centro desta pesquisa é se esses Neandertais foram influenciados por antigos contemporâneos do H. sapiens na produção desse tipo de osso esculpido.

Leder, que trabalha no Serviço Estadual de Patrimônio Cultural da Baixa Saxônia, e seus colegas acreditam que os neandertais tinham as capacidades manuais e intelectuais para produzir o artefato independentemente de qualquer influência humana moderna.

Eles sustentam sua hipótese com evidências arqueológicas que sugerem que o H. sapiens chegou à Europa Central vários milênios depois que o osso esculpido e gravado foi datado.

No entanto, dadas as evidências recentes da troca de genes entre os neandertais e os humanos modernos há mais de 50.000 anos, Bello acha que não podemos descartar a possibilidade de o H. sapiens ter tido alguma influência na produção desses tipos de artefatos pelos neandertais.

“Dada essa troca inicial de genes, não podemos excluir uma troca de conhecimento semelhante entre humanos modernos e populações de Neandertal”, ela escreveu.

“A possibilidade de um conhecimento adquirido do homem moderno não subestima, na minha opinião, as habilidades cognitivas dos neandertais. Pelo contrário, a capacidade de aprender, integrar a inovação na própria cultura e se adaptar a novas tecnologias e conceitos abstratos deve ser reconhecido como um elemento de complexidade comportamental”.

A pesquisa foi publicada na Nature Ecology and Evolution.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.