Pular para o conteúdo

Cientistas, filósofos e livres pensadores que a Inquisição matou e/ou oprimiu em nome de Deus

Por Victor Rossetii
Publicado na NetNature

A Inquisição foi criada pela Igreja Católica Romana durante a Idade Média, especialmente no século XIII. Ela era composta por tribunais, locais onde julgavam as pessoas que eram consideradas ameaças aos preceitos da doutrina da instituição. As pessoas suspeitas eram perseguidas, julgadas e condenadas a cumprir penas – desde prisão temporária ou perpétua, tortura ou morte na fogueira, onde os condenados eram queimados em praça pública para servir de exemplo aos outros.

Representação do Tribunal do Santo Ofício.

Não é possível negar o passado da Igreja Católica – em especial, seus tribunais, torturas e condenação. É como negar o Holocausto ou a Ditadura Militar. Curiosamente, há grupos religiosos que negam essas praticas extremas cometidas pela Igreja Católica. Certa vez, li na internet um texto de um apologista cristão, onde nega a perseguição promovida pela Igreja Católica contra cientistas e pensadores. Sua argumentação era:

Uma das alegações mais infantis, pueris e tolas que se podem vir dos apedeutas ateístas militantes, céticos desinformados e outros simplistas, é a alegação de que ‘a Igreja Católica queimava cientistas’. Bom, além da alegação estar absurdamente mal feita (nem a Igreja nem a Inquisição “queimaram” alguém. Isto demonstra um péssimo entendimento simplório da relação entre Igreja e estado e poder civil), é mal formulada. É preciso entender muita coisa antes de se chegar a conclusões precipitadas…Em nenhum caso, houve qualquer coisa a ver com perseguição e opressão da Igreja contra a ciência, o conhecimento e liberdade de pensamento.

Deixemos de lado as ofensas e as tentativas de rebaixamento propostas pelo autor e observemos apenas a estrutura da ideia, segundo a qual a Igreja não perseguiu e nem oprimiu a ciência, o conhecimento e a liberdade de pensamento. Primeiro, argumentar que a Igreja Católica perseguiu e matou livres pensadores não tem absolutamente nada a ver com militância. Haviam alguns pensadores que criticavam a Igreja – em especial a trindade cristã – e alguns que foram acusados (ou eram, de fato, assumidamente) de ateísmo, mas isso não tem relação com militância ateísta, mas com o reconhecimento de parte da história da humanidade – sobretudo, aos brutais erros cometidos pela igreja, que assumidamente matou muitos pensadores na Idade Média.

A alegação não é mal feita, ela apenas não é aceita por alguns proponentes e apologistas da causa cristã que pretendem negar o lado sombrio de sua própria história. Portanto, aqui vou dar alguns dos nomes de pensadores que foram perseguidos e/ou mortos pela Igreja Católica na Idade Média, incluindo o tribunal cristão e as acusações das quais foram condenados. Portanto, não é uma alegação mal feita, mas uma constatação registrada historicamente que o autor do comentário acima omitiu ou não assume: e pior, é reconhecida pela própria Igreja Católica. Em outras palavras, o autor do comentário acima está enganando as pessoas de forma intencional.

A primeira constatação de que a Igreja Católica matou – e matou muito – foi dada quando o Papa João Paulo II veio a público no dia 15/04/2004 pedir perdão pelos crimes de morte e tortura cometidos pela Santa Inquisição. Ele se desculpou pelos “erros cometidos a serviço da verdade por meio do uso de métodos que não têm relação com a palavra do Senhor“. O Papa disse, que o pedido de perdão valia “tanto para os dramas relacionados com a Inquisição quanto para as feridas deixadas na memória [coletiva] depois daquilo“. A declaração papal foi lida em uma carta durante uma entrevista coletiva convocada para o lançamento de um livro sobre a Inquisição (Época, 2004).

Desse modo, a própria Igreja Católica reconheceu seus erros e crimes cometidos contra a humanidade ao torturar, julgar e condenar pessoas em nome de uma verdade absoluta cristã. Durante toda a Idade Média, houve uma luta pelo poder e pela imposição da verdade absoluta cristã da Igreja Católica sobre cientistas e filósofos. A Igreja se colocou como detentora da verdade sobre todos os assuntos, inclusive sobre a natureza. Essa atitude durante séculos impediu a liberdade investigativa da natureza: inicialmente, no conhecimento grego, que foi banido, e a partir do século XII, com Tomás de Aquino e outros “pais da Igreja”, apresentado algumas visões filosóficas da natureza dos gregos que haviam sido incorporadas na Teologia Católica e impostas à sociedade. Dessa forma, a Igreja Católica concentrava em si mesma a autoridade para assuntos religiosos e filosóficos: a estratégia era transpassar o ar de autoridade ao mesmo tempo que adotava uma forma autoritarismo intelectual, na qual todos deviam se submeter sob ameaças de terríveis punições (Gruning, 2007). Inclusive, foi essa concentração de autoridade que desencadeou a Reforma Protestante, que começou em 1517. Ela surgiu exatamente para protestar e bater de frente contra o poder da Igreja Católica em delimitar o que era certo e errado, argumentando que os princípios do cristianismo deveriam ser dados pelas Cinco Solas e não por uma imposição de uma Igreja que se autoproclamava detentora da verdade.

Obviamente, a ciência surgiu de uma forma totalmente submissa à autoridade e ao poder da religião. Galileu, que é um dos pais da ciência experimental, foi pressionado a se retratar diante do tribunal da Inquisição, dizendo que era falsa a ideia de que a Terra girava em torno do seu eixo e do Sol.

As primeiras Universidades surgiram de antigos monastérios. Com a modernidade, a filosofia da natureza desenvolveu seus próprios métodos de investigação e a ciência se voltou contra a religião, tornando-se institucionalmente laica – isto é, independente da Igreja. (Esse fato tem sido negado por muitos fundamentalistas até os dias de hoje, algo que fica evidenciado com o surgimento de grupos negacionistas das teorias da Evolução e do Big Bang.) A observação e a experimentação foram sendo compreendidas em um sentido mais amplo e fundamental para a construção do conhecimento sobre a natureza (Gruning, 2007).

Na Idade Média, muitos cientistas foram perseguidos, censurados e até condenados por defenderem ideias contrárias à doutrina cristã. O caso mais comum foi protagonizado pelo, já citado, astrônomo italiano Galileu Galilei, que quase foi levado à fogueira por afirmar que o planeta Terra girava ao redor do Sol (heliocentrismo). Ele teve que censurar sua própria afirmativa para não perder a vida: ou seja, foi perseguido. A mesma sorte não teve o filósofo italiano Giordano Bruno, que foi julgado e condenado à morte pelo tribunal.

Giordano Bruno foi condenado por sustentar opiniões contrárias à fé católica ao apoiar a visão copernicana. Sua condenação aconteceu por contestar ministros da igreja, negar a fé católica sobre a Trindade, a divindade de Cristo e a encarnação, rejeitar Jesus como Cristo, contrapor a virgindade de Maria como mãe de Jesus e a transubstanciação quanto a missa. Outros motivos envolveram sua reivindicação de existência de uma pluralidade de mundos e suas eternidades, crenças em metempsicose e transmigração da alma humana em brutos e envolvimento com magia e adivinhação (Firpo, 1993).

Historicamente, o início da Idade Média (Era Medieval) é caracterizado pela queda do Império Romano do Ocidente, após a queda do imperador no ano 476 (século V), e persiste até por volta de 1500. Entretanto, a perseguição propelida pela Igreja Católica persistiu por muito mais tempo, ocorrendo no Renascimento e, até mesmo, no Iluminismo.

O Tribunal do Santo Ofício da Inquisição foi fundado pelo Papa Gregório IX (1.145 – 1.241), que mandou para a fogueira milhares de pessoas que eram consideradas hereges – ou seja, que seguiam doutrinas ou práticas contrárias ao que era definido pela Igreja Católica: como praticar atos considerados de bruxaria, heresia ou simplesmente por professar outra religião que não fosse o catolicismo. Curiosamente, os alquimistas eram considerados bruxos, mas foram importantes para o desenvolvimento da ciência. Os “bruxos” foram os criadores do Oleum vitriolum e da Aqua fortis, conhecidos respectivamente hoje como ácido sulfúrico (H2SO4) e ácido nítrico (HNO3). Grande parte do conhecimento que a ciência teve sobre anatomia, química e matemática foi produzido por pessoas em situações consideradas condenáveis pela Igreja Católica. Da Vinci, que fez preciosos esboços de anatomia, abria corpos durante a madrugada para estudá-los e também para pintar suas obras, pois a Inquisição poderia acusá-lo como praticante de bruxaria, caso fosse descoberto.

É comum que proponentes de visões religiosas (como apologistas) defendam que sem os pressupostos do cristianismo, a ciência moderna não existiria ou que teorias, como o Big Bang, partem de pressupostos cristãos inseridos na estrutura filosófica da ciência. Contudo, essa defesa é insustentável, porque, apesar da ciência que conhecemos hoje ter dado seus primeiros passos em uma Europa cristã fervorosa, devemos lembrar que sua estrutura filosófica começou a ser formalizada no Renascimento – o período que marcou uma revitalização dos princípios clássicos gregos e romanos e uma época marcada pela quebra desta relação de poder da teologia dos séculos anteriores. Além, é claro, de grande parte da ciência ter sido influenciada pelos árabes. Portanto, é verdade que a química moderna tem origem na alquimia, mas a alquimia continua errada – uma razão pela qual ela não é uma ciência. Da mesma forma que a astrologia continua errada em relação à astronomia ou que o fixismo, Scala naturae e teleologia são conceitos errados e impróprios para explicar a diversidade de espécies que encontramos na natureza, o que é melhor explicado pela evolução darwiniana.

Com a teoria do Big Bang não é diferente. Ela não pode ser reduzida a uma concepção cristã, porque o Universo teve uma origem. Alguns proponentes da fé cristã alegam que a teoria do Big Bang parte de pressupostos cristões: essa defesa é tendenciosa. Esse tipo de alegação parte de uma profunda lógica reducionista anticientífica, que é utilizada para fundamentar a si mesma: 1) se o Universo teve origem, então o cristianismo está certo; 2) se o Universo não teve origem, então o budismo (ou qualquer outra religião que sustente algo próximo) está correto; 3) como a ciência diz e justifica empiricamente a origem do universo, então o cristianismo está exato; 4) logo, o Big Bang é uma teoria fundamentada no cristianismo e que comprova sua veracidade.

Essa argumentação parte de uma série de pressupostos que nada mais são do que uma forma de catequizar a ciência. Isso porque a afirmativa científica e os dados propostos pelos cosmólogos não fazem uso de pressupostos religiosos. De certa forma, essa lógica não é absolutamente nada diferente do que a Igreja Católica fazia na Idade Média, como subverter o conhecimento a uma forma de dominação da religião.

Historicamente, é perceptível a ascensão da autoridade e do domínio opressor da Igreja Católica sobre dos povos. Em 1252, a situação piorou quando o Papa Inocêncio IV publicou um documento chamado “Ad Exstirpanda”, onde autoriza o uso da tortura como forma de conseguir a conversão. O documento foi sendo renovado pelos papas seguintes reforçando o poder da Igreja e a perseguição (Bishop, 2006).

Malleus Maleficarum.

Houve inclusive a criação do Malleus Maleficarum, título original em latim do chamado “O Martelo das Bruxas” publicado em 1486 ou 1487 pelos dominicanos Heinrich Kraemer e James Sprenger, na Alemanha (Broedel, 2002), em cumprimento à bula papal Summis Desiderantis Affectibus de Inocêncio VIII. Era um manual de tortura completo que descrevia e ensinava os métodos mais dolorosos de tortura e como aplica-los aos praticantes de heresias. Ele tornou-se o principal guia dos inquisidores pelo restante do século XV e séculos seguintes; embora outros manuais tenham sido escritos no período, este é dos mais perversos e cruéis utilizados para torturas e matar quem fosse considerado herege (Rodrigues, 2012).

O Index Librorum Prohibitorum, em tradução livre o “Índice dos Livros Proibidos”, teve sua primeira versão promulgada pelo Papa Paulo IV em 1559 e estabeleceu uma lista de publicações literárias que eram proibidas pela Igreja Católica e as regras para que um livro entrasse nessa lista eram teorias que a Igreja Católica Apostólica Romana não apoiasse (Cambridge, 1999). Nessa lista estavam livros que iam contra os dogmas da Igreja e que continham conteúdo tido como impróprio. Muitos pensadores e cientistas entraram nesta lista: Giordano Bruno, Nicolau Maquiavel, Voltaire, Erasmo de Roterdã, John Locke, Berkeley, Denis Diderot, Blaise Pascal, Thomas Hobbes, René Descartes, Rousseau, Montesquieu, David Hume ou Immanuel Kant, Pascal, Dante de Alighieri (na qual a igreja Católica idealizou a noção atual de inferno, bem caracterizada nos quadros de Botticelli), Descartes, Jean-Jacques Rousseau.

A trigésima segunda edição do Index, publicada em 1948, continha mais de 4000 títulos censurados por várias razões: heresia, deficiência moral, sexualidade explícita, incorreção política, etc. O Index foi abolido somente em 14 de junho de 1966 pelo Papa Paulo VI (Cambridge, 1999).

Index Librorum Prohibitorum.

Nota-se então que não é possível defender a tese de que a Igreja Católica não perseguia quem contrariasse sua verdade absoluta. De fato, Gustav Henningsen e Jaime Contreras estudaram os registros da Inquisição Espanhola, que lista 44.674 casos, dos quais 826 resultaram em execuções e 778 em efígies (criação de bonecos de palha que eram queimados no lugar da pessoa) (Henningsen, 1992). William Monter estima 1.000 execuções ocorreram entre 1530-1630 e 250 entre 1630-1730 (Monter, 2003). Jean-Pierre Dedieu estudou os registros do tribunal de Toledo, que colocou 12 mil pessoas em julgamento (Dedieu, 1981). A Inquisição Espanhola foi uma instituição fundada em 1478 por Fernando II de Aragão e Isabel de Castela para manter a ortodoxia Católica em seus reinos que atuou de 1478 até 1834.

Para o período anterior a 1530, Henry Kamen estima que houve cerca de duas mil execuções em todos os tribunais da Espanha (Kamen, 2004). Os tribunais eclesiásticos atuaram inclusive no Brasil (ver abaixo), em especial, em Minas Gerais entre 1700 e 1820, onde aconteceram 989 denúncias nas comarcas do Rio da Morte, do Rio das Velhas, do Serro do Frio e na de Vila Rica (Resende et al, 2015).

Portanto, os registros de tortura e condenação são muito maiores do que aqueles direcionados apenas a cientistas e pensadores que tinham pensamentos diferentes ao da Igreja Católica. A perseguição começou cedo.

No ano 520 o filósofo Boécio tornou-se chefe de todos os serviços governamentais e judiciais na administração de Teodorico “O Grande” na Panônia, uma antiga província do império Romano. Boécio era um homem da ciência, helenista dedicado interessado em traduzir todas as obras de Aristóteles para o latim e harmonizá-las com as obras de Platão. Mesmo sendo cristão, por razões desconhecidas (aparentemente de natureza político-religiosa) o imperador Teodorico (que era cristão arianista) ordenou que Boécio fosse morto. Ele foi executado aos 44 anos no dia 23 de outubro de 524, depois de um período na prisão durante o qual ele escreveu sua obra mais famosa a De consolatione philosophiae (ou Consolação da Filosofia) (Richards, 1979).

Por mil anos os únicos filósofos foram aqueles a Igreja permitiria. Milhares de homens perseguidos pela escolástica (estrutura monástica teológica da Idade Média que tentou conciliar fé e razão e que hoje é de interesse apenas dos historiadores).

Abelardo (1079-1142) foi um dos melhores filósofos clericais do século 12. Sua fama e ideias lhe rendeu muitas críticas de seus colegas escolásticos e ele foi repetidamente julgado por heresia do sabelianismo (crença não-trinitária) em um sínodo provincial em Soissons em 1121. Seus ensinamentos o levaram a queimar seu livro antes de ser encarcerado no convento de St. Medard em Soissons. Mais tarde, em 1141 um conselho da igreja acusou-o de uma série de novas heresias. Sua condenação foi confirmada por Roma, um ano mais tarde. Ele morreu a caminho de Roma, com a intenção de recorrer a sentença (Marenbon, 2004).

Amaury de Chartres era um nativo de Bene, perto de Chartres. Ele viveu em Paris, onde deu aulas de lógica e ensinando sobre panteísmo. Por sua obra Physion, foi condenado pela bula do Papa de Inocêncio III em 1204 e queimado. Dez dos seus discípulos também foram queimados em Paris em 20 de dezembro de 1210. Mesmo depois de morto, seus ossos foram exumados e colocados nas chamas novamente (Geschichte Häresie).

Roger Bacon (1214-1294) foi um filósofo Inglês e frade franciscano que deu ênfase no estudo da natureza através de métodos empíricos. Foi um dos primeiros defensores europeus do método científico moderno e é conhecido como “Doctor Mirabilis” (professor maravilhoso). Bacon escreveu o Opus Majus que contém tratados de matemática, ótica, alquimia e as posições e tamanhos dos corpos celestes. Até então, a Igreja não pautava sua ciência nas observações do mundo natural, mas nos argumentos de autoridade bíblica e nas ideias de Aristóteles. Em seus escritos, Bacon fez um chamado para uma reforma do estudo teológico. Ele era fluente em várias línguas e lamentou a corrupção de escrituras, das obras dos filósofos gregos, especialmente por erros de tradução e más-interpretações. Ele defendeu estudo experimental sobre a autoridade e rejeitou as autoridades cegas tanto no estudo teológico quanto científico. Bacon também criticou o calendário juliano, descrevendo-o como risível (ou ridículo) propondo sua reforma. Ele ressaltou que “as coisas deste mundo não podem ser conhecidas sem o conhecimento da matemática”, e criticou filósofos escolásticos da Igreja.

Foi periodicamente perseguido e preso, embora os registros sejam limitados. Ele também foi acusado de praticar magia (uma acusação padrão contra pensadores originais) e de “novidades suspeitas”. Certamente, a Igreja não gostava de sua originalidade e suas atividades, especialmente depois do ano 1250 quando livros foram restringidos por um estatuto estabelecido por um franciscano que proibiu a publicação de livros ou panfletos sem a aprovação específica. Bacon era amigo do Papa Clemente e dava certa proteção. Em 1268 o Papa morreu e Bacon perdeu o seu protetor. As condenações de 1277 proibiram o ensino de certas doutrinas filosóficas, incluindo a astrologia determinista. Nos próximos dois anos, Bacon foi aparentemente preso ou posteriormente colocado sob prisão domiciliar. A primeira referência a prisão de Bacon ocorreu oitenta anos após sua morte sob a acusações não especificadas e chamadas apenas de “novidades suspeitas” (Maloney, 1988). Apesar de perseguido e preso terminou sua vida livre e parece ter morrido pouco depois da prisão, sendo enterrado em Oxford (Molland, 2004).

Pietro d’Abano.

Pietro d’Abano (1257- 1315), também conhecido como Petrus De Apono ou Aponensis d’Abano era um filósofo, matemático, físico e professor de medicina em Pádua, na Itália. Ele foi acusado de praticar magia, com a ajuda do diabo e argumentaram que ele possuía a pedra filosofal. Seu verdadeiro crime parece ter sido a aquisição do conhecimento das sete artes liberais: trivium (lógica, gramática, retórica) e do quadrivium (aritmética, música, geometria, astronomia) e eram consideradas as disciplinas próprias para a formação de um homem livre. Foi acusado também de ter negado o papel de anjos e demônios em controlar a natureza. Ele foi pego duas vezes perante a Inquisição Medieval. Na primeira ocasião, ele foi absolvido, mas alguns inquisitores nunca ficaram satisfeitos com a sua absolvição e o prenderam novamente. Ele morreu em uma prisão da Inquisição em 1315 antes de seu segundo julgamento ser concluído. Ele foi considerado culpado, mesmo depois de morto, seu corpo foi condenado a ser exumado e queimado. Entretanto, um amigo tinha secretamente removido seu corpo, fazendo com que a Inquisição proclamasse a queima pública sua éfige em praça pública (Chisholm, 1911).

Cecco d’Ascoli (1257-1327) foi um polímata italiano que estudou matemática e astrologia. Em 1322 foi professor de astrologia na Universidade de Bolonha. Seus discursos de livre pensamento e simplicidade fizeram com que ganhasse muitos inimigos na Igreja, sendo acusado de impiedade. Ele foi condenado por heresia em 1324 a cumprir jejuns e orações, e ao pagamento de uma multa, mas isso não o impediu (Chisholm, 1911). Ele foi julgado e condenado por recair em heresia e foi queimado vivo em Florença em 26 de setembro, 1327. Em seu septuagésimo aniversário uma linha de estudiosos da universidade foi queimado pela Inquisição (Thorndike, 1934).

Eckhart von Hochheim (1260-1327) foi um teólogo e filósofo alemão. Seu trabalho influenciou grandes filósofos alemães nos séculos seguintes. Conceitos introduzidos na metafísica por Eckhart desviaram-se da escolástica e suas ideias inovadoras irritou muitos clérigos. Ele foi repetidamente acusado de heresia e inicialmente escapou das acusações vivo. Em Colônia, o arcebispo Hermann von Virneburg mais uma vez o acusou de heresia, e novamente ele foi inocentado. O arcebispo pressionou suas acusações de heresia contra Eckhart e contra seu protetor, um Dominicano, e apelaram ao Papa pela sua condenação, mas não obtiveram sucesso. Após várias tentativas e muitas defesas a Inquisição se recusou a aceita seu recurso e em 22 de fevereiro 1327 Eckhart foi condenado por heresia. Nada mais se sabe sobre ele, pois a partir de então seus registros de vida sumiram. Assume-se que tenha morrido logo em seguida. O Papa João XXII emitiu um documento em 1329, estabelecendo que as declarações de Eckhart eram heréticas. Sabe-se que Eckhart foi excomungado antes de desaparecer(McGinn, 2001).

William de Ockham (1288-1348) foi um frade franciscano inglês e filósofo escolástico conhecido por ter proposto o princípio lógico da navalha em que estabelecia que o menor número de premissas assumidas e o menor número de entidades era o que explicava melhor um determinado fenômeno (Patriquin, 2007). Ele estudou teologia na Universidade de Oxford entre 1309 a 1321 e defendeu uma reforma da escolástica, tanto no método quanto no conteúdo teológico e é tão importante para ciência quanto os pensadores Renascentistas. Isto porque foi um importante pensador e crítico da escolástica. Exatamente por ser escolástico que a criticava, por conhecer suas falhas. Ockham escreveu fórmulas que na lógica proposicional posteriormente foram chamadas de Leis de De Morgan; que formulava a simplificação de expressões em álgebra booleana. Ele investigou a lógica ternária, um conceito que viria a ser retomado na lógica matemática do século 19. Seus avanços e críticas não foram bem recebidos pelas autoridades da igreja. Em 1324, alguns de seus comentários foram condenados por um sínodo de bispos, em Avignon (residência papal na França). Chamado para se defender perante um tribunal papal foi condenado por dois anos, e preso em uma casa franciscana, até que ele foi condenado como herege em 1326. Temendo a execução, Ockham e outros simpatizantes franciscanos fugiram de Avignon em 26 de Maio 1328. Refugiou-se na corte do Imperador Romano-Germânico Louis IV da Baviera. Ockham escreveu tratados que defendiam o Rei Louis para ter o controle supremo sobre a Igreja e o Estado no Império Romano. Por isto, Ockham foi excomungado pelo Papa João XXII (McGrade, 1974).

Wiliiam Tyndale.

Wiliiam Tyndale (1484-1536) também passou por maus bocados por traduzir a Bíblia em inglês. Tyndale estudou as escrituras e começou a defender as teses da Reforma Protestante, muitas das quais eram consideradas heréticas, primeiro pela Igreja Católica que passou a persegui-lo e depois pela Igreja Anglicana. As traduções de Tyndale foram banidas pelas autoridades e o próprio Tyndale foi queimado na fogueira em 1536 em Vilvoorde (Bruxelas), na atual Bélgica, sob o comando de agentes de Henrique VIII e a Igreja Anglicana (Tyndale).

Pouco tempo depois começou o episódio com Galileu e as acusações. Papa Urbano VIII então propôs a Galileu escrever um livro no qual ele poderia ao mesmo tempo dar a palavra aos partidários da tese aristotélica e sugerir o heliocentrismo. Galileu escreveu o Dialogo sopra i due massimi sistemi del mondo (Diálogo sobre os dois principais sistemas do mundo), que foi lançado em 1632. Nele, Veneza serve de cenário para três protagonistas que, ao longo de quatro dias, enfrentam-se numa justa oratória. Filippo Salviati, um florentino que fala pela boca do autor, Giovanni Francesco Sagredo, um eruditto veneziano que é encarregado de encarnar a neutralidade do ponto de vista, e Simplicius que, precário defensor da tradição ptolomaica, sofre o tiro cruzado dos outros dois e fica com fama de tolo.

A obra se assemelhava a um discurso em defesa da doutrina de Nicolau Copérnico. Não apenas colocou a prova do movimento da Terra, mas também ridicularizou o argumento e várias pessoas, inclusive o Papa (Historia Viva).

Dialogo sopra i due massimi sistemi del mondo (Diálogo sobre os dois principais sistemas do mundo) de Galileu – Lançado em 1632.

Johannes Kepler (1571-1630) foi um astrônomo e matemático alemão, considerado figura-chave da revolução científica do século XVII. É mais conhecido por ter formulado as três leis fundamentais da mecânica celeste, conhecidas como Leis de Kepler. Em sua vida, Kepler foi diversas vezes perseguido pela Contra-Reforma Católica. A Contra-Reforma, também conhecida por Reforma Católica é o nome dado ao movimento que surgiu no seio da Igreja Católica como resposta à Reforma Protestante iniciada com Lutero, a partir de 1517.

Sua família foi perseguida por bruxaria e Kepler faleceu em 1628, durante a Guerra dos Trinta Anos. Sua vida e trabalho assinalam o nascimento da astronomia moderna (Costa, 2006).

René Descartes (1596-1650) era um filósofo francês, matemático e escritor que passou a maior parte de sua vida adulta na república holandesa. Ele é considerado o “pai da filosofia moderna” e suas obras são estudadas até hoje, em especial O Discurso do Método. Embora ele fosse um católico romano, sua abordagem cética abriu a caminho para o fim do escolasticismo e o nascimento da filosofia moderna. Quando Galileu foi condenado pela Inquisição Romana em 1633, Descartes abandonou os planos para publicar sua Traité du Monde, uma obra que lhe custou quatro anos, e queimou o manuscrito. Em sua época, Descartes foi acusado de defender segredos deístas ou crenças ateístas. Em 1641 suas “Meditações Sobre a Filosofia Primeira” irritou o clero e o fez fugir de seu país. Sua filosofia foi condenada pela Universidade de Utrecht em 1643. Ele ganhou asilo pela Rainha da Suécia e morreu em Estocolmo em 1650. Em 1663, o Papa colocou suas obras no Index Librorum Prohibitorum, especialmente o livro “Meditações sobre Filosofia Primeira” que é um texto padrão na maioria dos departamentos de filosofia em universidades ocidentais (Pacievitch, 2013).

Livro de Descartes.

Miguel Servet (1511-1553) era um humanista espanhol. Polímata versado em matemática, astronomia e meteorologia, geografia, cartografia, anatomia humana, medicina e farmacologia, bem como a jurisprudência em traduções, poesia e o estudo acadêmico da Bíblia em suas línguas originais. Ele é conhecido na história de vários destes campos, particularmente na medicina. Ele foi o primeiro europeu a descrever corretamente a função da circulação pulmonar.

Participou da Reforma Protestante e passou a negar a Trindade. Foi condenado por católicos e protestantes. No dia 04 de abril de 1553 foi preso por autoridades católicas romanas em Vienne. Servet escapou da prisão, três dias depois. Uma efígie e seus livros foram queimados na sua ausência. Fugindo para a Itália, Servet foi para Genebra, onde Calvino e seus reformadores o havia denunciado.

Foi preso em Genebra e em 17 de junho, ele foi condenado por heresia por suas 17 cartas enviadas por Jehan Calvin e condenado a ser queimado. Inquisidores franceses pediram para que Servet fosse extraditado para a França, mas Calvin preferido que Servet fosse executado pelos protestantes. Ele foi queimado na fogueira como herege no dia 27 de outubro de 1553, por decisão do Conselho do BCE Protestante de Genebra (McNeill, 1954).

Miguel Servet.

Gerolamo Cardano (1501-1576) era um filósofo italiano e polímata. Ele escreveu mais de 200 obras sobre filosofia, medicina, matemática, física, religião e música. Ele formulou regras da probabilidade, tornando-o um dos fundadores do campo. Ele foi o primeiro matemático a fazer uso sistemático de números negativos. Publicou as soluções das equações cúbicas e quárticas em um livro de 1545. Na medicina, ele foi o primeiro a descrever a febre tifóide. Ele inventou vários dispositivos mecânicos, incluindo o fechamento de combinação, o cardan, e o eixo Cardânico com juntas universais. Foi um dos primeiros a afirmar que as pessoas surdas podem aprender a ler e escrever sem aprender a falar primeiro. Cardano foi acusado de heresia em 1570 porque tinha calculado o horóscopo de Jesus dezesseis anos antes e principalmente, por causa de sua mente racionalista. Ele foi preso e passou vários meses na prisão, foi forçado a renunciar seu cargo de professor, mas parece ter sobrevivido a Inquisição graças a amigos que o ajudaram. Ele foi premiado com uma pensão pelo Papa Gregório XIII (Westfall, 2012).

Desiderius Erasmus (1466 – 1536) ou Erasmo de Rotterdam, era holandês, erudito clássico, pensador renascentista humanista, crítico social, escritor e professor. Erasmus foi um dos primeiros defensores da tolerância religiosa, e recebeu o título de “príncipe dos humanistas”. Ele preparou edições latinas e gregos do Novo Testamento e levantou questões que seriam influentes na Reforma Protestante. Ele era crítico dos abusos generalizados dentro da Igreja Católica. Entre os principais objetos de seu ataque eram os excessos da Igreja e os princípios da vida em ordens religiosas. Membros do movimento Contra-Reforma Católica muitas vezes condenaram Erasmus como tendo “posto o ovo que chocou a Reforma.” Sua erudição e enorme e popularidade era assegurada por sua segurança pessoal, mas todas as suas obras foram colocadas no Index pelo Papa Paulo IV (Hoffmann, 1989).

Étienne Dolet (1509-1546) era um estudioso francês e tradutor. Enquanto estudava Direito na Universidade de Toulouse foi jogado na prisão e banido por decreto do parlamento por suas opiniões religiosas. Dolet foi criticado por católicos e protestantes, em parte por causa de suas opiniões anti-trinitárias e parcialmente por causa de sua defesa ao racionalismo, que ambas Igrejas viam como anti-cristãs.

Seus inimigos conseguiram aprisioná-lo em 1542 sob a acusação de ateísmo. Depois da prisão por quinze meses, ele foi liberado. Ele escapou de uma nova prisão em Piedmont no ano de 1544, mas, ao se aventurar de volta a Paris foi novamente preso e marcado como um ateu pela Faculdade de Teologia da Sorbonne. Foi torturado e em seguida, no dia 03 de agosto de 1546 foi estrangulado e queimado em Maubert no dia do seu aniversário de 37 anos. Dolet foi apelidado de “mártir da Renascença”, e a justificativa de sua morte foi a heresia de transportar um pacote de suas publicações para o mercado local, onde ele e seus livros foram queimados juntos. Seus bens foram confiscados e sua viúva e filhos foram despejados, vivendo da mendicância (Chisholm, 1911).

Bernardino Telesio (1509-1588) era um filósofo italiano e cientista naturalista. Sua ênfase na observação fez dele o “primeiro dos modernos” que eventualmente desenvolveu o método científico. Ele estudou ciência e filosofia que constituíram o currículo dos savantes renascentistas. Como outros filósofos, ele atacou o aristotelismo medieval e a escolástica.

De Rerum Natura luxta Propria Principia.

Sua obra De Rerum Natura luxta Propria Principia (Sobre a Natureza das Coisas de acordo com seus próprios princípios) foi seguido por um grande número de trabalhos científicos e filosóficos. Telesio escreveu o De Rerum Natura que descrevia a construção do mundo e a magnitude dos corpos nele contido, bem como a natureza do mundo, deve ser procurada não pela razão, como defendiam os antigos, mas deve ser entendido por meio de observação.

Esta declaração resume a filosofia Telesiana. Seus pontos de vista despertaram a ira da Igreja por causa de seu racionalismo e seus argumentos convincentes contra o aristotelismo. Ele também não fez distinção alguma entre a física superlunar e sublunar, como a Igreja fazia na época. Ele também argumentou que, se a alma é influenciada por condições materiais, em seguida, a alma deve ter uma existência material. Ele foi uma grande influência no desenvolvimento do empirismo científico e filosófico e é uma figura importante na história da filosofia. Pouco tempo depois de sua morte, seus livros foram colocados no Index (Chisholm, 1911).

Pierre Charron (1541-1603) era um teólogo francês, católico, filósofo e um discípulo e contemporâneo de Michel Montaigne. Depois de estudar Direito, ele se tornou um padre. Ele promoveu uma série de ideias que poderia facilmente ter conduzido a sua detenção pelas autoridades da Igreja, incluindo a impossibilidade de uma alma imaterial e críticas a superstição. Ele foi atacado, em particular pelo jesuíta François Garasse, que o considerou ateu. Ele conseguiu manter o patrocínio de simpatizantes poderosos, e assim escapou prisão e execução para expressar suas ideias. Ele morreu repentinamente de derrame em 1603. Uma das suas principais obras é um livro especialmente cético De la sagess, que considerava aspectos do cristianismo totalmente anti-racionais e recebe hoje uma atenção renovada pelos filósofos. Hoje, Charron é considerado como um dos fundadores do secularismo moderno (Kraye, 1990).

De la sagess de Pierre Charron.

Pomponio Algerio (1531-1556) era um estudante de direito civil da Universidade de Pádua, cujas ideias filosóficas atraíram a atenção da Inquisição Romana. Entre defendia que “a Igreja Católica Romana é uma Igreja particular e nenhum cristão deveria limitar-se a qualquer Igreja particular. Esta Igreja se desvia em muitas coisas da verdade”.

Depois de um ano de prisão, ele ainda se recusou a se retratar. As autoridades venezianas não iriam concordar com uma execução, de modo que o Papa Paulo IV enviou funcionários para extraditá-lo para Roma. Em Roma, no dia 21 de Agosto, 1555, um monge visitou Pomponio em sua cela estimulando-o a arrepender-se. Se ele não se arrependesse seria estrangulado. O estudante de 24 anos de idade, recusou-se e um método alternativo de tortura e execução foi aplicado. Em 22 de agosto de 1556 Algerio foi executado na Piazza Navona. Mantendo a compostura enquanto foi queimado em praça pública com óleo quente. Ele permaneceu vivo por 15 minutos antes de falecer (Grendler, 2004)

Lucilio Vanini (1585-1619) era um livre-pensador italiano, que em suas obras denominou-se Giulio Cesare Vanini. Ele estudou filosofia, teologia, medicina e astronomia. Como Giordano Bruno, ele mostrou as fraquezas da escolástica. Ele se tornou um padre e um professor, viajando pela Europa, sempre sob suspeitas por seus pontos de vista. Ele escreveu contra o ateísmo, aparentemente em uma tentativa de dissipar suspeitas sobre suas crenças não convencionais. Ele começou a ensinar em Toulouse e em 1618 novembro de 33 anos, foi preso, e depois de um julgamento foi condenado a ter a língua cortada, depois ser estrangulado, queimado em uma fogueira até o corpo virar cinzas. A sentença foi aplicada em 09 de fevereiro de 1619 (Westfall, 2014).

Cesare Cremonini (1550 – 1631), era um professor italiano da filosofia natural, apoiando o racionalismo e materialismo aristotélico dentro da tradição escolástica. Estes dois pontos de vista eram condenáveis para a Igreja, porque se opunham a revelação e a imortalidade dualista da alma. Padres em Veneza acusaram-no de materialismo (e, portanto, o ateísmo) e, em seguida, suas acusações chegaram a Roma. Ele foi processado em 1604 pela Inquisição romana por ateísmo e heresia Averroista de “dupla verdade”. Na época, Pádua estava sob domínio veneziano Tolerante, ele então, foi mantido fora do alcance da Inquisição, por isso evitou o julgamento.

Ele é um excelente exemplo do efeito da Igreja sobre filósofos pensadores-livres. Embora reconhecido como uma mente brilhante, não fez quase nenhuma contribuição para a ciência ou para a filosofia moderna e é lembrado principalmente como um dos estudiosos que se recusavam a olhar pelo telescópio de Galileu. Quando Galileu anunciou que havia descoberto montanhas na Lua, em 1610, ele ofereceu a Cremonini a oportunidade de observar a evidência através de um telescópio. Cremonini, ciente do poder da Inquisição relutante recusou-se até mesmo a olhar através do telescópio e insistiu que Aristóteles tinha provado que a Lua só poderia ser uma esfera perfeita, de acordo com o ensinamento da Igreja (Addington, 1887).

Tommaso Campanella (1568-1639) era um filósofo, teólogo, astrólogo, e poeta italiano cujos pontos de vista, especialmente sua oposição à autoridade de Aristóteles, colocou em conflito direto com as autoridades eclesiásticas. Ele foi denunciado à Inquisição Romana e no Tribunal do Santo Ofício em Roma, sendo preso em um convento até 1597. Posteriormente foi capturado e preso em Nápoles, onde foi torturado na cremalheira.

Cremalheira – Instrumento de tortura da Idade Média.

Ele fez uma confissão completa e teria sido condenado à morte se não tivesse fingido uma suposta loucura e até colocou fogo em sua cela. Foi torturado ainda mais (em um total de sete vezes) e, em seguida, quando estava aleijado e doente, foi condenado a prisão perpétua. Campanella passou vinte e sete anos preso em Nápoles, nas condições mais deploráveis que um ser humano poderia ficar. Durante sua detenção, ele escreveu suas obras mais importantes e posteriormente libertado em 1626, pelo Papa Urbano VIII, que, pessoalmente, intercedeu em seu nome com Filipe IV da Espanha. Levado para Roma e mantido por um tempo pela Inquisição, Campanella foi restabelecido a liberdade em 1629. Ele viveu por cinco anos em Roma, onde foi assessor de Urbano em assuntos astrológicos. Em 1634, em uma nova conspiração na Calábria, liderada por um de seus seguidores surgiu novas ameaças de condenação. Com a ajuda do cardeal Barberini e o embaixador francês de Noailles, ele fugiu para a França, onde foi recebido na corte de Louis XIII. Protegido pelo Cardeal Richelieu e recebeu uma pensão do rei, passou o resto de seus dias em o convento de Saint-Honoré, em Paris (Firpo, 1974).

François de La Mothe Le Vayer (1588-1672) era um escritor francês, professor e pensador. Ele foi admitido na Academia Francesa em 1639, e foi o tutor de Luís XIV. Escreveu uma série de livros de geografia, retórica, moralidade, economia, política e da lógica. Modesto e cético tornou-se popular na corte francesa. Ele praticou uma crítica erudita, e cuidadosamente escondida sobre a hipocrisia religiosa. Ele foi fundamental em popularizar Ceticismo na França.

Suas obras filosóficas incluem De la vertu des païens de 1642; (Sobre a bondade dos Pagãos); um tratado intitulado Du peu de certitude qu’il y a dans l’histoire em 1668 (Sobre a falta de Certitude na História), que marcou o começo da crítica histórica na França. Além disto, escreveu cinco textos céticos chamados de Dialogues, publicados postumamente sob o pseudônimo Orosius Tubero, falando sobre a diversidade de opiniões, a variedade de costumes de papéis ma vida e sexo, o valor da solidão, a virtude dos tolos de seu tempo, e as diferenças de religião. Se tivesse publicado durante a sua vida, teria sido queimado na fogueira pela Inquisição.

Théophile de Viau (1590-1626) entrou em contato com as ideias de Epicuro e do filósofo italiano Lucilio Vanini que questionavam a imortalidade da alma. Em 1622, uma coleção de poemas licenciosos, Le Parnasse satyrique, foi publicado sob o nome dele, e de Viau foi denunciado pelos clérigos no ano seguinte, acusado de ateísmo. Ele foi condenado a aparecer com os pés descalços em Notre Dame em Paris e para ser queimado vivo. Passou a se esconder, assim que a sentença foi executada em uma efígie. O veredicto causou tal um clamor na sociedade que cada vez mais se tornava secular e liberal que, quando ele foi capturado, sua sentença foi alterada para o banimento permanente. de Viau passou os últimos meses de sua vida em Chantilly, sob a proteção do Duque de Montmorency antes de morrer em Paris em 1626 (Chisholm, 1911).

Kazimierz Lyszczynsk (1634-1689) era um nobre polonês e filósofo, e assumidamente ateu. Um livro publicado por Lyszczynsk foi passado para um bispo local, que, juntamente com um segundo bispo condenaram-no a execução. Ele foi descoberto por ter escrito uma dissertação intitulada De non existentia Dei (A não existência de Deus), que afirmou que Deus não existe e que as religiões são as invenções do homem.

O bispo Zaluski, acusou Lyszczynski de ter negado a existência de Deus e de proferir blasfêmias contra os santos. Ele reconheceu tudo o que lhe foi imputado, fez uma retratação completa de tudo o que ele poderia ter dito e escrito contra a doutrina da Igreja Católica Romana, e declarou toda a sua submissão à sua autoridade. Ainda sim ele foi executado. O carrasco marcou com um ferro em brasa a língua, queimou suas mãos e por fim foi queimado vivo (Chołoniewski, 1918)

Pierre Bayle (1647-1706) era um filósofo e escritor francês cujo trabalho influenciou o Iluminismo. Ele se converteu ao catolicismo quando estudava no Colégio dos Jesuítas em Toulouse, no ano de 1669, mas a sua nova fé durou apenas 17 meses. Ele abjurou o catolicismo e tornou-se cético, como evidenciado no livro Thoughts on the Comet, na qual ele compara os supostos males do ateísmo com os males reais de fanatismo. Ciente do destino de outros pensadores seculares em Toulouse, ele fugiu para a Suíça, e mais tarde para a República Holandesa. Lá defendeu uma separação entre fé e razão, e ocupou uma série de cargos acadêmicos, muitas vezes perdendo-os quando as autoridades religiosas se opunham aos seus ensinamentos – embora na República Holandesa estivesse relativamente a salvo de seus maiores críticos, incluindo a Inquisição. Bayle foi privado de sua cadeira em 1693. Uma de suas obras foi condenado a ser queimada em público.

Dictionnaire Historique et critica.

Bayle trabalhou em sua enorme obra, o Dictionnaire Historique et Critica (Dicionário histórico e crítico), uma das primeiras enciclopédias de ideias. Ele expressou a opinião de que muito do que foi considerado verdade era apenas opinião, e que a credulidade e a obstinação foram predominantes. O dicionário foi um trabalho acadêmico importante por várias gerações após a sua publicação e continua a ser uma obra de valor. As obras de Bayle inauguraram o Iluminismo. Nos tempos modernos, Bayle tem sido chamado de “Pai da discussão livre” (LoConte, 2011)

John Toland (1670 – 1722) nasceu na Irlanda e renunciou à sua fé católica na juventude. Foi para a Universidade de Edimburgo, onde se tornou um importante pensador em 1690. Ele passou a Leyden, onde desenvolveu suas ideias céticas.

Em seu primeiro livro Christianity not Mysterious de 1696, ele argumentou que a revelação divina da Bíblia não contém verdadeiros mistérios. Para ele, todos os dogmas genuínos da fé poderiam ser compreendidos e demonstrados pela razão devidamente treinada a partir de princípios naturais. Por isso, foi processado por um júri em Londres. Como era um assunto do Reino da Irlanda, membros do parlamento irlandês propuseram que ele deveria ser queimado na fogueira, e em suas cópias do livro queimadas em público, em Dublin. Toland comparou os legisladores protestantes a papistas inquisidores que realizaram a execução do livro, quando não puderam aproveitar o que o autor havia escrito, e a quem havia destinado às chamas. Toland foi denunciado pelo Dr. Blackhall ao Parlamento, e em uma de suas obras ele respondeu as acusações e fugiu, sendo recebido pela rainha da Prússia. Toland foi, provavelmente, um ateu, mas ele se identificou como o panteísmo em sua publicação Socinianism Truly Stated possivelmente porque ele estava antecipando a captura e julgamento (Gilbert, 1854).

Christianity Not Mysterious de John Toland.

Thomas Hobbes (1588-1679) foi um dos principais fundadores da filosofia política moderna. Ele também contribuiu para uma diversificada gama de outros campos, incluindo história, a geometria, a física de gases, teologia, ética, Desenvolveu alguns dos fundamentos do pensamento liberal europeu: o direito do indivíduo; a igualdade natural de todos os homens; o caráter artificial da ordem política; a visão de que todo o poder político legítimo deve ser “representativo” e com base no consentimento do povo; e uma interpretação liberal da lei que deixa as pessoas livres para fazer o que a lei não proíbe explicitamente.

Hobbes foi acusado de ateísmo, e de ensinar pontos de vista que poderiam levar ao ateísmo. No parlamento, os bispos queriam que ele fosse julgado e executado como um herege, mas não encontraram nenhuma lei para justificar-se. O rei teve um papel importante na proteção Hobbes em 1666, quando a Câmara dos Comuns, introduziu uma lei contra o ateísmo e profanação. Nesse mesmo ano, em 17 de outubro 1666, foi ordenado que a comissão a que o projeto de lei foi encaminhado que deveria ser habilitada a recepção de informações em livros que tendem ao ateísmo, blasfêmia e profanação. No livro de Hobbes chamado de Leviatã ele pontua questões em que poderiam ser tratadas como um herege, e de fato, queimaram alguns de seus artigos (Martinich, 1995).

A única consequência que veio da comissão foi que Hobbes nunca poderia, posteriormente, publicar qualquer coisa na Inglaterra em assuntos relacionados com a conduta humana. A edição de 1668 de suas obras foi impressa em Amsterdam porque ele não podia obter licença para a sua publicação na Inglaterra. Outros escritos não foram divulgados até depois de sua morte. Hobbes sequer foi permitido responder aos seus inimigos religiosos. Mesmo assim, sua reputação no exterior foi amplamente aceita.

Hobbes ficou aterrorizado com a perspectiva de ser rotulado como um herege, e passou a queimar alguns de seus papéis comprometedores. Ao mesmo tempo, ele examinou o estado atual da lei de heresia. Os resultados da sua investigação foram anunciados pela primeira vez em três diálogos curtos adicionados como um apêndice à sua tradução latina do Leviatã, publicado em Amsterdã em 1668. Neste apêndice, Hobbes teve como objetivo mostrar que, uma vez que o Supremo Tribunal de Comissão tinha sido colocado abaixo, não restou tribunal de heresia em tudo para que ele fosse favorável, e que nada poderia ser heresia, exceto a oposição ao Credo Niceno, na qual ele afirmava não ter feito em sua obra Leviatã (British History Online, 2005).

Paul-Henri Thiry, o Barão d’Holbach (1723-1789) era um filósofo francês, cientista, escritor e tradutor. Embora nobre, rico e influente, seus pontos de vista ateus teriam sido o suficiente para tê-lo queimado vivo, então ele publicou suas abras sob pseudônimos e teve seu trabalho impresso fora do país. Sua filosofia era expressamente materialista e ateísta e hoje é categorizado para o movimento filosófico chamado materialismo francês. Ele viu o cristianismo e a religião em geral, como um impedimento para o avanço moral da humanidade. Reconhecido pela sua generosidade, ele foi o patrono das Encyclopædists, e contribuiu com cerca de quatrocentos artigos para a Enciclopédia.

Barão d’Holbach.

Ele traduzido do alemão várias obras sobre a química e mineralogia, e do Inglês Pleasures of the Imagination de Mark Akenside. Em 1765, ele visitou a Inglaterra e produziu inúmeros trabalhos de livre-pensador. Ele escreveu ou traduzido muitas obras, tinha publicado em Amsterdam o Christianity Unveiled, The Spirit of the Clergy, Sacred Contagion or Natural History of Superstition. Estas obras foram condenadas a serem queimadas por um decreto do parlamento francês no dia 8 de agosto de 1770. D’Holbach também escreveu e publicou The Critical History of Jesus Christ, Portable Theology, an Essay on Prejudices, Religious Cruelty, Hell Destroyed. Estes trabalhos foram principalmente transmitidos em Amsterdam, e o segredo de sua autoria foi cuidadosamente preservado, então d’Holbach escapou perseguição.

Em 1770, ele publicou sua principal obra The System of Nature, ou as leis da física e moral mundo, um livro-texto de filosofia ateísta. As idéias explicitamente ateístas provocou uma forte reação. A Igreja Católica ameaçou a coroa francesa com a retirada do apoio financeiro, a menos que suprimisse o livro. d’Holbach, em seguida, publicou uma espécie de resumo sob o título Good Sense atribuído a Jean Meslier. Em 1773, ele escreveu sobre Natural Politics and the Social System. Seu último trabalho importante foi a Universal Morality; or the Duties of Man founded upon Nature. Ele morreu, pouco antes da Revolução Francesa, tendo enganado quem teria perseguido-o se tivesse revelado sua identidade (Blom, 2010).

Jean Meslier (1664-1729) era um padre católico de uma aldeia francesa que teve uma publicação descoberta após sua morte, chamado Common Sense promovendo o ateísmo e denunciando todas as religiões. O trabalho foi descrito pelo autor como seu “testamento” aos seus paroquianos, e é comumente referido como o testamento de Meslier. Nos três exemplares descobertos após sua morte, ele repudiou o cristianismo, colocando em duvida todos seus dogmas, pediu para ser enterrado em seu próprio jardim, e deixou sua propriedade para seus paroquianos. Voltaire publicou um trabalho falando de Meslier com o título Extract from the sentiments of Jean Meslier. Nele Voltaire repete a famosa frase de Jean “O homem só será livre quando o último rei for enforcado nas tripas do último padre“.

A frase é igualmente conhecida, na versão de Diderot (Curran, 2013). Denis Diderot (1713 – 1784), era filosofo e poeta, e foi incessante perseguido por ter feitos duras críticas ao cristianismo. Teve a ajuda de muitos amigos. A festa eclesiástica detestava a Encyclopédie, na qual ele era um dos principais autores (Chisholm, 1911).

Voltaire.

Mesmo Voltaire, a partir de 1762, começou a defender as pessoas injustamente perseguidas, como é o caso de Jean Calas. Este era um comerciante de Huguenot que tinha sido torturado até a morte em 1763, supostamente porque havia assassinado seu filho por querer se converter ao catolicismo. Seus bens foram confiscados e seus filhos restantes foram retirados da viúva e forçados a tornarem-se membros de um mosteiro. Voltaire, vendo isso como um caso claro de perseguição religiosa, conseguiu derrubar a condenação em 1765 (Hewett, 2006).

Jean Calas (1698 -1762) vivia em Toulouse, na França e mesmo com a ajuda de Voltaire foi vítima de um julgamento tendencioso devido a ele ser um protestante em uma sociedade Católica oficialmente romana. Na França, ele se tornou uma vítima simbólica de intolerância religiosa, juntamente com François-Jean de La Barre e Pierre-Paul Sirven. O filho de Jean cometeu suicídio, e a esmagadora evidência de que a morte foi um suicídio foi o testemunho de Jeanne Vigneire, uma governanta Católica. O tribunal ignorou e considerou que Jean Calas havia assassinado seu próprio filho. Calas foi torturado em uma tentativa de levá-lo a admitir um crime que não havia cometido. Seus braços e pernas foram estendidos na cremalheira até os ossos se soltarem do tronco. Posteriormente, derramaram 17 litros de água em sua garganta para que confessasse o crime. Por fim, ele foi amarrado a uma cruz na praça da catedral, onde cada um de seus membros foi quebrado duas vezes por uma barra de ferro. No entanto, com toda essa tortura continuou a declarar sua inocência (Goldstone, 2002). Em 09 de março de 1762 o parlamento de Toulouse condenado Jean Calas à morte na roda. Em 10 de Março, com a idade de 64, ele morreu torturado na roda afirmando firmemente sua inocência.

Roda de tortura – Com os membros presos em uma roda de madeira, as pessoas viam seus braços e pernas serem atingidos pelos torturadores com grandes martelos de metal. Depois disso, eram pendurados – ainda na roda – em praça pública, para que animais se alimentassem das vítimas vivas.

Claude-Adrien Helvétius (1715-1771) era um filósofo francês descendente de uma linhagem de médicos célebres. Ele tinha uma grande fortuna e foi atraído pela leitura de Locke. Dedicou-se à filosofia, retirou-se para uma propriedade rural, onde ele empregou sua fortuna no alívio dos pobres, o fomento da agricultura e do desenvolvimento de novas indústrias.

Em agosto de 1758 publicou um trabalho sobre a mente De L’Esprit que continha ideias consideradas materialista e ateístas. De acordo com Helvétius todas as faculdades humanas poderiam ser reduzidas a sensação física, mesmo a memória, comparação e julgamento. A única diferença em relação aos animais inferiores reside na nossa organização externa. Defendia também que não existe tal coisa como direito absoluto. As ideias de justiça e injustiça mudam de acordo com os costumes. As extremidades do governo são para garantir a maximização do prazer. Ética pública têm uma base utilitária, e ele insistiu sobre a importância da cultura, educação e no desenvolvimento nacional. A educação é o método pelo qual se reforma a sociedade, e há poucos limites para as melhorias sociais que poderiam ser provocadas pela distribuição adequada de educação. Suas doutrinas ateístas, utilitárias e igualitárias causou um clamor da Igreja. Na época os sacerdotes convenceram o tribunal de que ele estava cheio de doutrinas ateístas perigosas. O livro foi declarado herege e foi condenado por ambos, Igreja e Estado. Ele foi condenado pelo Papa Clemente XIII e em 31 de janeiro 1759 foi queimado por ordem do Parlamento francês em 06 de fevereiro de 1759 (David, 1965).

Até hoje a relação entre a Igreja Católica Romana e ciência é bastante discutida porque historicamente, a Igreja tem sido muitas vezes vista como patrono das ciências. E apesar da ciência surgir numa Europa cristianizada a ciência tem o seu próprio método e que não tem nada a ver com revelações divinas, dogmas, tradições religiosas e autoridades bíblicas. Ela atua na base do empírico, das hipóteses gerando paradigmas substituíveis.

De L’Esprit de Helvétius.

Historiadores da ciência, matemáticos católicos medievais e filósofos como John Buridan, Nicole Oresme e Roger Bacon são vistos como os fundadores da ciência moderna. Após a queda de Roma, mosteiros e conventos se tornaram bastiões de bolsas de estudos na Europa Ocidental e clérigos foram os principais estudiosos da época – estudar a natureza, matemática e o movimento das estrelas (em grande parte para fins religiosos) durante a Idade Média era atividade recorrente. A Igreja fundou as primeiras Universidades da Europa, produzindo estudiosos como Robert Grosseteste, Alberto Magno, Roger Bacon e Tomás de Aquino, que ajudaram a estabelecer o método científico. Durante este período, a Igreja também foi um grande patrono da engenharia para a construção de catedrais elaboradas. Desde a Renascença, cientistas católicos foram creditados como pais de uma variada gama de áreas científicas: Jean-Baptiste Lamarck (1744-1829) figura importante na teoria da evolução com o Lamarckismo; o Frei Gregor Mendel (1822-1884) foi pioneiro da genética e o Padre Georges Lemaitre (1894-1966) que propôs o modelo cosmológico do Big Bang. Os padres estavam particularmente presentes na ciência, especialmente na astronomia.

No século 19, a tese de conflito surgiu a propor um conflito intrínseco ou conflitos entre a Igreja e ciência. O uso histórico original do termo afirmou que a Igreja tem sido em oposição perpétua para a ciência. A tese interpreta a relação entre a Igreja e a ciência como inevitavelmente levando a hostilidade pública, quando a religião desafia agressivamente novas ideias científicas, como no caso de Galileu. Uma crítica alternativa é que a Igreja opõe-se a particulares descobertas científicas que sentiram sua autoridade e poder sendo desafiadas; especialmente através da Reforma e no meio Iluminismo. O Conselho do Vaticano (1869-1870) declarou que “Fé e razão são de ajuda mútua uns aos outros”. A Enciclopédia Católica de 1912 diz que “Os conflitos entre a ciência e a Igreja não são reais, e afirma que a crença em tais conflitos são baseadas em falsas premissas”. O Papa João Paulo II sintetizou a visão católica da relação entre fé e razão na encíclica Fides et Ratio, dizendo fé e razão são como duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade, e que Deus colocou no coração do homem o desejo de conhecer a verdade.

A Inquisição no Brasil

No Brasil, os tribunais chegaram a ser instalados no período colonial, porém não apresentaram “muita força” como na Europa. Foram julgados, principalmente no Nordeste, alguns casos de heresias relacionadas ao comportamento dos brasileiros, além de perseguir alguns judeus que aqui moravam.

No Brasil muitos famílias e indivíduos sofreram torturas ou foram assassinados durante a inquisição promovida por Portugal. Um estudo feito pelo genealogista Alberto Kremnitzer apresenta algumas destas famílias e as acusações na qual foram sujeitas. Em seu trabalho ele destaca a família  Rodrigues   de   origem   judaica,   que   perdeu   filhos torturados ou queimados durante a perseguição da inquisição portuguesa. Durante os séculos XVI e XVII.

Ele relata o caso de Manoel de Abreu Campos que vivia de sua fazenda e foi torturado e morto queimado no dia 13 de março de 1669 por ser judeu convicto. Era morador da Bahia, Brasil e seu filho João de Abreu Campos, 22 anos, já havia sido condenado a prisão perpétua no dia 11 de março de 1668. Seu filho Jerônimo de Abreu Campos, 28 anos, condenado a perpétua com insígnias de fogo na pele no dia 11 de março de 1668.

Anastácia Abreu de Oliveira, de 36 anos, mulher de Antônio Vellez, um lavrador foi queimada viva no dia 4 de novembro de 1742 por ser judia convicta, acusada de ser falsa, dissimulada e impenitente. Seu filho João Vellez, 18 anos, trabalhador, condenado a prisão perpétua em 26 de setembro de 1745.

Estes são só alguns dos diversos casos identificados no artigo de Kremnitzer na qual demonstra a truculência da Inquisição promovida pela Igreja Católica e seu Tribunal.

Quando o Brasil foi descoberto, a inquisição estava a todo vapor na Europa e em nosso país durou por cerca de três séculos: ou seja, o Brasil passou por séculos de intolerância religiosa, de crueldade e violência com aqueles que foram processados, condenados e executados nas fogueiras da Inquisição em Lisboa, Évora e Coimbra. Das treze naus que compunham a esquadra de Pedro Álvares Cabral, onze delas eram comandadas pelos capitães que apresentavam nomes de Cristãos-Novos, um nome dado aos judeus que foram obrigados à se converter ao catolicismo pela Inquisição. Dentre eles esta Simão de Pina, Simão de Miranda de Azevedo, Sancho de Tovar, Nicolau Coelho, Aires Gomes da Silva, Gaspar de Lemos que era um judeu de origem polonesa e outros. Na terra natal de Cabral, Belmonte, existiu uma grande colônia judaica e o próprio descobridor do Brasil tinha descendência de judeus conversos ao cristianismo a força. Fernando de Noronha era descendente de cristãos-novos, era rico e amigo do Rei de Portugal, Dom Manoel. No domínio holandês no Brasil, muitos judeus holandeses de origem portuguesa vieram para Recife, onde fundaram duas sinagogas, a Zur Israel e a Maguem Abraham, as primeiras sinagogas das Américas. Muitos desses judeus foram após a expulsão para o Caribe e para a Nova Amsterdã, hoje conhecida como Nova Iorque. Logo após o período holandês e o ciclo da cana-de-açucar, inicia-se em Minas Gerais o ciclo do ouro onde muitos cristãos-novos portugueses do nordeste brasileiro vieram para a terra das Alterosas. Muitos saíram do Brasil condenados a fogueira com destino às fogueiras da Inquisição em Lisboa. Dentre eles, podemos ver seus sobrenomes bem brasileiros, como os Cardoso, Miranda, Nunes, Silva, Pereira, Pinto, Azevedo e muitos outros.

O primeiro Museu da História da Inquisição dedicou uma sala especial à história do Ciclo do Ouro em Minas Gerais e Brasil e a presença judaica no nordeste brasileiro. Historiadores como a Dra. Anita Novinsky e Dra. Neusa Fernandes junto a tantos outros afirmam que o Brasil hoje contém a maior população de descendentes de cristãos-novos (“Marrranos” ou Anussim) do mundo, alcançando com certeza mais de 10% da população brasileira e, até mesmo 20%, para alguns historiadores (Museu da Inquisição).

Portanto, quando alguma pessoa disser que não houve perseguição da Igreja Católica a livres pensadores, filósofos, cientistas ou mesmo pessoas com formações religiosas distintas, descrentes, e críticos da Igreja esta afirmativa é falsa. O registro histórico é rico em detalhes de pessoas que foram perseguidas, acusados de heresia, torturados e mortos pela Igreja. Quando alguém nega algo que é de conhecimento mundial esta tentando esconder a história suja de suas crenças pessoais ou esta propagandeando uma afirmativa enganosa.

Referências

  • Addington, John Symonds: Renaissance in Italy, Volume 1, 1887, footnote 11
  • Bishop, J (2006). Aquinas on Torture New Blackfriars, 87:229.
  • Broedel, H. P. (2002). «To Preserve the Manly Form from so Vile a Crime: Ecclesiastical Anti-Sodomitic Rhetoric and the Gendering of Witchcraft in the Malleus Maleficarum». Essays in Medieval Studies, n. 19, pp. 136-148.
  • Blom, Philipp: A Wicked Company. The Forgotten Radicalism of the European Enlightenment. Basic Books, New York, (2010), p. 302
  • Brewer’s Dictionary of Phrase and Fable – Unitarianism (1898)
  • British History Online. House of Commons Journal Volume 8″. Retrieved 14 January 2005.
  • Chisholm, Hugh, ed. (1911). “Abano, Pietro D’”. Encyclopædia Britannica 1 (11th ed.). Cambridge University Press. p. 7.
  • Chołoniewski, Antoni. The Spirit of Polish History. Translated by Jane (Addy) Arctowska. Published by The Polish Book Importing Co., inc., 1918.
  • Costa, J. R. V. Johannes Kepler. Astronomia no Zênite, jan 2006.
  • Curran, Andrew S. (24 January 2013). “Diderot, an American Exemplar? Bien Sûr!”. New York Times. Retrieved 27 January 2013.
  • David, Warner Smith. Helvetius: A Study in Persecution. Clarendon Press Oxford, 1965.
  • Dedieu, J. P. (1981) Los Cuatro Tiempos, in Bartolomé Benassar, Inquisición Española: poder político y control social, pp. 15-39.
  • Firpo, L. Il processo di Giordano Bruno, 1993.
  • Gilbert JT, History of the City of Dublin (1854) vol 3 p66.
  • Goldstone (2002). Out of the Flames. p. 256.
  • Grendler, Paul F. (29 September 2004). The Universities of the Italian Renaissance. JHU Press. p. 190.
  • Gruning, H – “Deus e a Nova Metafísica- um diálogo aberto entre ciência e religião”, editora aleph (2007)
  • Henningsen, G. The Database of the Spanish Inquisition. The relaciones de causas project revisited, in: Heinz Mohnhaupt, Dieter Simon, Vorträge zur Justizforschung, Vittorio Klostermann, 1992, pp. 43-85.
  • Hewett, Caspar J. M. (August 2006). “The Great Debate: Life of Voltaire.”. Retrieved 2 November 2008.
  • Hoffmann, Manfred. “Faith and Piety in Erasmus’s Thought”, Sixteenth Century Journal (1989), 20#2, pp. 241-258
  • Kamen, H. Inkwizycja Hiszpańska, Warszawa 2005, p. 62; and H. Rawlings, The Spanish Inquisition, Blackwell Publishing 2004.
  • Kraye, Jill (1990). “Moral Philosophy”. In Charles B. Schmitt, Quentin Skinner (eds.). The Cambridge History of Renaissance Philosophy. Cambridge University Press. p. 315.
  • LoConte, Joseph. “The Golden Rule of Toleration”, Christianity Today, Accessed 6 March 2011.
  • Martinich, A. P. (1995) A Hobbes Dictionary, Cambridge: Blackwell.
  • Maloney, Thomas S., ed., (1988), Compendium of the Study of Theology: Edition and Translation with Introduction and Notes, Studien und Texte zur Geistesgeschichte des Mittelalters, No. 20, Leiden: E.J. Brill.
  • Marenbon, John (2004). “Life, milieu and intellectual contexts”. In Brower, Jeffrey E; Guilfoy, Kevin. ‘The Cambridge Companion to Abelard. Cambridge University Press. pp. 14–17.
  • McGinn, B. The Mystical Thought of Meister Eckhart, (New York: Crossroad Publishing Company, 2001).
  • McGrade, Arthur (1974). The Political Thought of William of Ockham: Personal and Institutional Principles. Cambridge University Press.
  • McNeill, John T. The History and Character of Calvinism, p. 176. New York: Oxford University Press, 1954.
  • Molland, George (2004). “Bacon, Roger (c.1214–1292?)”. Oxford Dictionary of National Biography (online ed.). Oxford University Press.
  • Monter, W. Frontiers of Heresy: The Spanish Inquisition from the Basque Lands to Sicily, Cambridge 2003.
  • Pacievitch, T. «René Descartes» (em inglês). InfoEscola. Consultado em 10 de fevereiro de 2013.
  • Patriquin, Travis. Exército dos EUA (2007). «O Princípio da Navalha de Occam para Vincular Fatos» (PDF). Military Review. Consultado em 2 de janeiro de 2013.
  • Resende, Maria Leônia Chaves de; Souza, Rafael José de (2015). Em nome do Santo Ofício: cartografia da Inquisição nas Minas Gerais (Belo Horizonte: Fino Traço).
  • Richards, The Popes and the Papacy in the Early Middle Ages (London: Routledge and Kegan Paul, 1979).
  • Rodrigues, M. C. (21-Mar-2012). «Malleu Maleficarum – a bruxaria como afirmação do poder espiritual» (PDF). Revista Brasileira de História das Religiões.
  • Triebel, Eckhart. «Geschichte Häresie».
  • Thorndike, Lynn (1934). History of Magic and Experimental Science, vol. 2. New York: MacMillan. pp. 953–4, 959.
  • Westfall, Richard S. “Cardano, Girolamo”. The Galileo Project. rice.edu. Archived from the original on 2012-07-19.
Victor Rossetti

Victor Rossetti

Sou formado em Ciências Biológicas (2007) com especialização em Educação Ambiental (2009). Sou autor do blog de Divulgação Científica NetNature, atualizado semanalmente, onde divulgo temas ligados a Evolução, Origem da Vida e Ecologia. Fiz iniciação científica na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) no Laboratório de Neurociência, no Instituto Butantã (no setor de artrópodes). Trabalhei também como educador ambiental em um parque ecológico, com coleta e identificação de lepidópteros. Fui representante da Organização World Wildlife Fund (WWF) em eventos de Educação Ambiental. Trabalho no laboratório de um colégio onde também sou professor de oficina de ciência e trabalhos de campo.