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Por que a atmosfera do Sol é centenas de vezes mais quente que sua superfície?

Por Marianna Korso e Huw Morgan
Publicado no The Conversation

A superfície visível do Sol, ou fotosfera, tem um calor de cerca de 6.000°C. Mas alguns milhares de quilômetros acima dela – uma distância pequena quando consideramos o tamanho do Sol – a atmosfera solar, também chamada de coroa, é centenas de vezes mais quente, atingindo um milhão de graus Celsius ou mais.

Esse pico de temperatura, apesar do aumento da distância da principal fonte de energia do Sol, foi observado na maioria das estrelas e representa um quebra-cabeça fundamental que faz os astrofísicos coçarem suas cabeças há décadas.

Em 1942, o cientista sueco Hannes Alfvén propôs uma explicação. Ele teorizou que as ondas magnetizadas de plasma poderiam transportar enormes quantidades de energia ao longo do campo magnético do Sol de seu interior para a coroa, contornando a fotosfera antes de explodir com o calor na atmosfera superior do Sol.

A teoria havia sido aceita provisoriamente – mas ainda precisávamos de provas, na forma de observação empírica, de que essas ondas existiam. Nosso estudo recente finalmente conseguiu isso, validando a teoria de Alfvén de 80 anos e nos levando um passo mais perto de aproveitar este fenômeno de alta energia aqui na Terra.

Questões candentes

problema do aquecimento coronal foi estabelecido desde o final dos anos 1930, quando o espectroscopista sueco Bengt Edlén e o astrofísico alemão Walter Grotrian observaram pela primeira vez fenômenos na coroa solar que só poderiam estar presentes se sua temperatura fosse de alguns milhões de graus Celsius.

Isso representa temperaturas até 1.000 vezes mais altas do que a fotosfera abaixo dela, que é a superfície do Sol que podemos ver da Terra. Estimar o calor da fotosfera sempre foi relativamente simples: precisamos apenas medir a luz do Sol que chega até nós e compará-la aos modelos de espectro que preveem a temperatura da fonte de luz.

Um vídeo disponibilizado pela NASA explica o problema do aquecimento coronal. O calor extremo da coroa solar é um dos problemas mais incômodos da astrofísica.

Ao longo de muitas décadas de estudo, a temperatura da fotosfera foi consistentemente estimada em cerca de 6.000°C. A descoberta de Edlén e Grotrian de que a coroa solar é muito mais quente do que a fotosfera – apesar de estar mais longe do centro do Sol, sua fonte final de energia – causou muita confusão na comunidade científica.

Os cientistas analisaram as propriedades do Sol para explicar essa disparidade. O Sol é composto quase inteiramente de plasma, que é um gás altamente ionizado que carrega uma carga elétrica. O movimento desse plasma na zona de convecção – a parte superior do interior solar – produz enormes correntes elétricas e fortes campos magnéticos.

Esses campos são então arrastados do interior do Sol por convecção e borbulham em sua superfície visível na forma de manchas solares escuras, que são aglomerados de campos magnéticos que podem formar uma variedade de estruturas magnéticas na atmosfera solar.

É aqui que entra a teoria de Alfvén. Ele raciocinou que, dentro do plasma magnetizado do Sol, qualquer movimento volumoso de partículas eletricamente carregadas perturbaria o campo magnético, criando ondas que podem transportar grandes quantidades de energia ao longo de vastas distâncias – da superfície do Sol à sua atmosfera superior. O calor viaja ao longo dos chamados tubos de fluxo magnético solar antes de estourar na coroa, produzindo sua alta temperatura.

Essas ondas magnéticas de plasma são agora chamadas de ondas de Alfvén, e sua parte na explicação do aquecimento coronal levou Alfvén a receber o Prêmio Nobel de Física em 1970.

Observando as ondas de Alfvén

Mas permaneceu o problema de realmente observar essas ondas. Há tanta coisa acontecendo na superfície do Sol e em sua atmosfera – desde fenômenos muitas vezes maiores que a Terra a pequenas mudanças abaixo da resolução de nossa instrumentação – que a evidência de observação direta das ondas de Alfvén na fotosfera não havia sido alcançada antes.

As manchas solares são as manchas mais escuras na superfície do Sol. Tradução da imagem: coroa solar (corona), cromosfera (cromosphere), fotosfera (photosphere), zona de convecção (convection zone), zona de radiação (radiative zone), núcleo (core), proeminência (prominence), mancha solar (sunspot) e erupção solar (solar flare). Créditos: Siberian Art / Shutterstock.

Mas os avanços recentes na instrumentação abriram uma nova janela através da qual podemos examinar a física solar. Um desses instrumentos é o espectropolarímetro bidimensional interferométrico (IBIS) para espectroscopia de imagem, instalado no

Telescópio Solar Richard B. Dunn, no estado estadunidense do Novo México. Este instrumento nos permitiu fazer observações e medições muito mais detalhadas do Sol.

Combinado com boas condições de visualização, simulações de computador avançadas e os esforços de uma equipe internacional de cientistas de sete instituições de pesquisa, usamos o IBIS para finalmente confirmar, pela primeira vez, a existência de ondas de Alfvén em tubos de fluxo magnético solar.

Nova fonte de energia

A descoberta direta de ondas de Alfvén na fotosfera solar é um passo importante para explorar seu potencial de alta energia aqui na Terra. Elas poderiam nos ajudar a pesquisar a fusão nuclear, por exemplo, que é o processo que ocorre dentro do Sol e que envolve pequenas quantidades de matéria sendo convertidas em enormes quantidades de energia. Nossas usinas nucleares atuais usam fissão nuclear, que os críticos argumentam que produz resíduos nucleares perigosos – especialmente no caso de desastres, incluindo o que ocorreu em Fukushima em 2011.

Criar energia limpa replicando a fusão nuclear do Sol na Terra continua sendo um grande desafio, porque ainda precisaríamos gerar 100 milhões de graus Celsius rapidamente para que a fusão ocorra. As ondas de Alfvén podem ser uma maneira de fazer isso. Nosso crescente conhecimento do Sol mostra que isso é certamente possível – nas condições certas.

Também esperamos mais revelações solares em breve, graças a novas missões e instrumentos inovadores. O satélite Solar Orbiter da Agência Espacial Europeia está agora em órbita ao redor do Sol, entregando imagens e fazendo medições das regiões polares não mapeadas da estrela. Pela Terra, a instalação de novos telescópios solares de alto desempenho também deve melhorar nossas observações do Sol.

Com muitos segredos do Sol ainda por descobrir, incluindo as propriedades do campo magnético solar, este é um momento empolgante para os estudos solares. Nossa detecção das ondas de Alfvén é apenas uma contribuição para um campo mais amplo que busca desvendar os mistérios remanescentes do Sol para aplicações práticas na Terra.

Julio Batista

Julio Batista

Sou Julio Batista, de Praia Grande, São Paulo, nascido em Santos. Professor de História no Ensino Fundamental II. Auxiliar na tradução de artigos científicos para o português brasileiro e colaboro com a divulgação do site e da página no Facebook. Sou formado em História pela Universidade Católica de Santos e em roteiro especializado em Cinema, TV e WebTV e videoclipes pela TecnoPonta. Autodidata e livre pensador, amante das ciências, da filosofia e das artes.