Os filósofos pré-socráticos foram os primeiros a propor explicações naturais para o surgimento e funcionamento do mundo, por exemplo: Anaximandro (610 a.C – 546 a.C.) propôs um modelo em que a Terra teria um formato cilíndrico, antes mesmo dos experimentos de Eratóstenes (276 a.C. – 194 a.C.) confirmarem que o planeta é redondo; Demócrito de Abdera (460 a.C. – 370 a.C.) é o exemplo mais significativo de contribuição à ciência, pois ele pressupôs uma noção primitiva de átomo, partindo da ideia de que há espaços vazios e divisíveis não-infinitamente na matéria. Muitos séculos depois, a hipótese de Demócrito chegou a dividir a física moderna entre defensores e negadores do modelo atômico até que a confirmação viesse dos experimentos de Joseph Thomson (1856 – 1940) e Ernest Rutherford (1871 – 1937).
A filosofia contribuiu com o desenvolvimento do método científico da ciência moderna. Na verdade, foi uma contribuição de múltiplos filósofos: Ibn Al-Haytham (965 – 1040), a partir de seus estudos sobre a refração da luz; o bispo inglês Robert Grosseteste (1170 – 1253), conhecido por ser o primeiro filósofo a conjecturar o Big Bang; o inglês Francis Bacon (1561 – 1626), com uma ideia mais organizada e sendo discutida na obra Novum Organum (1620); o astrônomo Galileu Galileu (1564 – 1642), que aplicou método científico, não apenas deduzindo hipóteses formalmente, mas fazendo experimentos de medição; o filósofo deísta Voltaire (1694 – 1778), responsável pela promoção de um “método científico antiespeculativo”.
Há a contribuição de filósofos à formulação do ceticismo, que é o princípio filosófico adotado na ciência moderna, por exemplo: uma versão inicial e mais radical, que está na contramão com a ciência moderna, é a que foi proposta por Pirro de Élis (360 a.C – 270 a.c), que advogava a suspensão radical de juízo, ou seja, a impossibilidade de afirmar ou negar algo. Em seguida, aparece o filósofo e matemático René Descartes (1596 – 1650), propondo o ceticismo metodológico, uma posição em que o sujeito deve encarar com dúvida conhecimentos que não sejam irredutivelmente evidentes e da mesma forma fundamentar suas teses de maneira consistente e irrefutável. Outra variação do ceticismo metodológico aparece no filósofo David Hume (1711 – 1776). No século passado, o astrônomo e divulgador científico Carl Sagan (1934 – 1996) e o filósofo naturalista Paul Kurtz (1925 – 2012), enfatizaram a importância do que é conhecido hoje como ceticismo científico, que a posição de que devemos duvidar de coisas para as quais não há boas evidências e construir nossas visões de mundo com base no conhecimento científico.
No século passado, o positivismo lógico movimentou a filosofia em uma direção mais analítica, propondo análises lógicas de enunciados e teorias científicas, principalmente com o filósofo e lógico Rudolf Carnap (1891 – 1970) e inspirações do trabalho do filósofo da linguagem Ludwig Wittgenstein (1889 – 1951). Em oposição às teses positivistas, apareceu o filósofo da ciência Karl Popper (1902 – 1994) com a obra A Lógica da Pesquisa Científica (1934), propondo um critério de demarcação entre ciência e não-ciência.
Após o positivismo lógico, o critério de demarcação de Popper acabou recebendo várias críticas por sua suposta superficialidade, principalmente da ala mais irracionalista. Thomas Kuhn (1922 – 1996) propôs uma visão da ciência sob a perspectiva social de uma comunidade de pesquisadores, em que cientistas passariam por fases de aceitação e rejeição às novas ideias (mudanças de paradigmas), seguindo uma transição quase que religiosa no sentido de que toda teoria estaria destinada a ser substituída totalmente por outra, assim como acontece com a moda. Em seguida, o austríaco Paul Feyerabend (1924 – 1994), carregando a farda do obscurantismo, do irracionalismo e do charlatanismo, publicou uma obra contra o método da ciência.
Alguns filósofos posteriores denunciaram imprecisões conceituais e equívocos filosóficos nos trabalhos de Thomas Kuhn e Paul Feyerabend. Em particular, a filósofa Margaret Masterman (1910 – 1986) apontou que Kuhn tinha utilizado mais de 10 significados diferentes para “paradigma” e o filósofo científico Mario Bunge (1919) demonstrou o porquê seria absurdo aderir ao “anything goes” de Feyerabend.
Hoje, filósofos continuam desenvolvendo trabalhos que buscam resolver parcialmente o problema da demarcação, indo bem além de Popper. O filósofo da biologia Massimo Pigliucci (1964) publicou uma obra em conjunto com outros pesquisadores que analisa o problema da demarcação e propõe uma filosofia da pseudociência. O filósofo científico Mario Bunge desenvolveu um critério de demarcação entre ciência e pseudociência que contém análises éticas, epistemológicas, ontológicas e metodológicas. O filósofo da biologia Martin Mahner, modernizando a partir do critério desenvolvido por Bunge, estendeu o critério para classificar humanidades e pseudohumanidades.
Em uma direção além do problema da demarcação, os filósofos têm estudado ciência para propor soluções para o problema mente-cérebro, por exemplo: como a consciência emerge a partir do cérebro humano ou por que temos qualia. Há filósofos que têm buscado entender a natureza última das coisas, usando a base da mecânica quântica em seus trabalhos filosóficos. Outros filósofos estão mais interessados nos problemas apresentados pelas interpretações filosóficas da teoria quântica (p. ex., a Interpretação de Copenhague de Niels Bohr e Werner Heisenberg, a Interpretação de Muitos Mundos de Hugh Everett, a Interpretação Realista de Mario Bunge, entre outras) e teorias que buscam unificar forças fundamentais da natureza. Há também uma ala filosófica preocupada com os problemas da cosmologia moderna, buscando responder questões como “O Universo é finito ou infinito?”, “O que é espaço”, “O que é tempo?”, “Quantas dimensões existem no mundo?”, “Quais são as implicações da descoberta das ondas gravitacionais na cosmologia atual?” e outras perguntas do tipo. Os filósofos da biologia estão interessados em entender “O que é vida?”, “Como a vida surge?”, “É possível criar uma vida artificial?”, etc. Por último, mas não menos importante, os filósofos da matemática estão interessados em entender a natureza dos números e a sua relação com a realidade.
Em conclusão, os filósofos têm estudado mais ciência e tecnologia para contribuir com o levantamento e a solução de problemas reais, pertinentes ao nosso conhecimento do momento. Embora não sejam todos os filósofos que adotem a atitude científica (ou cientificismo) e, portanto, esses caminham em direção oposta ao progresso do conhecimento autêntico. Os cientistas que rejeitam a filosofia em seus trabalhos, parecem estar presos a uma concepção de ciência subdesenvolvida e uma visão imprecisa de que a filosofia contemporânea está na contramão com o progresso da ciência. De fato, a ciência opera cercada de pressuposições filosóficas, como o realismo (a realidade independente do sujeito), o materialismo (a pressuposição de que todos os entes concretos são materiais), o sistemismo (a noção de que o todo é um sistema ou subsistema), o cientificismo (a filosofia que admite a ciência como a melhor forma para tratar problemas cognoscíveis), o emergentismo (a concepção de que todo sistema é dotado de algumas propriedades que faltam às suas componentes), o humanismo, entre outras. Então, consequentemente, rejeitar a filosofia da ciência contribuiria mais para substituir uma filosofia explícita e cientificamente informada por outra implícita, imatura e descontrolada, por exemplo: o realismo subjacente da investigação científica poderia ser substituído pela noção de que a realidade é imaginária ou construção social (p. ex., agentes patogênicos que podem afetar a condição de saúde de um indivíduo seriam apenas construções do cérebro de um ser senciente ou grupos sociais); o materialismo pela noção espiritualista de que existem almas ou cérebros desencarnados (p. ex., terapias espirituais bastariam para curar enfermidades); o sistemismo pela concepção individualista ou holista, que é insuficiente para entender como doenças afetam sistemas biológicos e a evolução do Universo; o cientificismo pela atitude anticientífica ou anticientificista, que rejeita todo progresso científico dos últimos séculos; e, principalmente, o humanismo pela prática mercenária (p. ex., produzir ou praticar alguma terapia ou método duvidoso tendo como objetivo apenas o enriquecimento ilícito).